Refutação à Tese de Cassiciacum, conhecida também como sedeprivacionismo ou Tese do papa materialiter-formaliter — Parte IRefutação à Tese de Cassiciacum, conhecida também como sedeprivacionismo ou Tese do papa materialiter-formaliter — Parte I

Divisão do artigo
1. No presente artigo, será feito a primeira parte de uma refutação pormenorizada da chamada “Tese de Cassiciacum” (doravante “Tese”1), analisando-a de maneira crítica e demonstrando seus diversos erros. Porém, como os adeptos da Tese divergem entre si em vários aspectos dela, pareceu-me melhor dividir a refutação em três partes e, portanto, em três artigos. Nesta primeira parte, farei uma exposição resumida da origem da Tese e de sua doutrina, mais conforme à visão de seu criador, Dom Guérard des Lauriers, O.P., bem como uma análise crítica à tal visão sobre determinado ponto da Tese, seguida possivelmente de objeções e soluções aos problemas suscitados pelas objeções geralmente levantadas pelos adeptos dela. Na segunda parte, farei como na primeira, mas tendo em vista na exposição os pontos da Tese modificados por alguns de seus seguidores, especialmente pelo Roman Catholic Institute2. Por fim, na terceira parte, concluirei com algumas considerações gerais sobre a Tese e proporei soluções às maiores dificuldades para com o sedevacantismo que os adeptos da Tese tendem a levantar quando não conseguem mais argumentos para defendê-la.
2. Além disso, seguindo o que costumam fazer os teólogos católicos em seus livros de teologia, o presente artigo, bem como os outros dois, está também numerado, a fim de facilitar a referência a algo dito em alguma parte deste mesmo artigo, indicando que se deve ver a parte referenciada pelo seu respectivo número; por exemplo, uma referência à parte em que se fala sobre a divisão do artigo, seria: “(ver n. 1)”.

Origem da Tese
3. A Tese foi criada pelo então Padre Guérard des Lauriers3, quando este há quase três anos esteve trabalhando como professor na Fraternidade São Pio X (doravante “FSSPX”) em Friburgo e Écône, na Suíça. O objetivo com a Tese era tentar explicar teologicamente como alguém que se supõe ser o Papa, como era o caso de Paulo VI e João Paulo II, pôde aprovar as heresias e erros do Vaticano II e do Magistério pós-conciliar, e justificar a resistência do movimento tradicionalista liderado por Dom Lefebvre, do qual o então Pe. Guérard fora expulso em 1977. A Tese foi depois exposta e defendida publicamente entre 1979 e 1981 com a colaboração do Pe. Bernard Lucien4 nos Cahiers de Cassiciacum, daí o nome “Tese de Cassiciacum”.

Resumo da Tese segundo Dom Guérard
4. A partir de pelo menos 7 de dezembro de 1965, data da promulgação da Declaração “Dignitatis humanæ personæ” do Vaticano II, que continha “uma proposição herética, quando deveria ser uma verdade infalivelmente revelada”5, o ocupante da Sé Apostólica, Paulo VI, deixou de ser Papa formaliter, pois com isso houve uma pública manifestação de que o ocupante da Sé Apostólica não tinha intenção de realizar o bem comum da Igreja, razão pela qual foi em algum momento privado da “autoridade papal”, que constituiria o aspecto formal do papado, mas continuou sendo Papa somente materialiter, em virtude da validade de sua eleição papal, que constituiria o aspecto material do papado.

A causa pela qual o ocupante da Sé Apostólica é privado de seu poder de governo
5. Segundo a Tese, a causa pela qual o ocupante da Sé Apostólica teria sido privado de seu poder de jurisdição ou de governo6 não é a heresia, como se enganam alguns, é, em realidade, a intenção manifesta de não ordenar a Igreja ao bem comum que lhe é próprio.

Diferença entre poder e autoridade
6. Em filosofia política, essa ordenação ao bem comum da sociedade é o que constitui a autoridade, propriamente dita. Conquanto se costuma usar como sinônimos, há uma distinção entre “poder” e “autoridade”, mas que na modernidade não se costuma fazer, o que pode acabar em uma confusão indevida entre “poder” e “autoridade”. Possui poder aquele que tem a capacidade efetiva, os meios de fato, de governar a sociedade. Possui autoridade aquele que possui a sabedoria teórica e prática para ordenar a sociedade ao seu bem comum7. Pode-se ter autoridade sem possuir o poder, assim como se pode possuir o poder sem autoridade, e, neste último caso, o exercício de um poder sem autoridade é o que constitui a tirania de um mau governante.

Como entender o uso do termo “autoridade”
7. Portanto, quando os adeptos da Tese alegam que o papa materialiter não tem “autoridade”, estão, na verdade, se referindo ao “poder”, a jurisdição ou potestade de governar, e quando alegam que a razão, pela qual o papa materialiter não tem sua potestade papal, é a de não buscar o bem comum da Igreja, estão, na verdade, se referindo à autoridade pessoal do papa materialiter, pois, como foi dito, a autoridade, propriamente dita, constitui em um saber teórico e prático para ordenar uma sociedade ao fim que lhe é próprio. É fundamental entender essa distinção, que é ignorada e confundida pelos próprios adeptos da Tese, pois assim ficará claro como a Tese contradiz a filosofia política de Aristóteles e Santo Tomás8.

Se a pessoa do Papa pode carecer de autoridade
8. Todos os teólogos católicos admitiram a possibilidade de um papa carecer de autoridade, agindo manifestamente contra o bem comum da Igreja, como exemplificou São Roberto Belarmino ao sustentar que é lícito resistir ao Soberano Pontífice que tentasse destruir a Igreja: “(…) assim como é lícito resistir ao Pontífice que agride o corpo, assim também é lícito resistir ao que agride as almas, ou que perturba a ordem civil, ou, sobretudo, àquele que tentasse destruir a Igreja. Digo que é lícito resistir-lhe não fazendo que ordena e impedindo a execução de sua vontade; não é lícito, contudo, julgá-lo, puni-lo ou depô-lo, pois estes atos são próprios a um superior”9. Mas nenhum desses teólogos falaram que esse possível “papa mau” estaria desprovido de seu poder de governar, a não ser João Wycliffe e João Huss que propunham, de maneira semelhante à Tese, que um papa mau, ou seja, um papa sem autoridade, não teria poder de governo sobre os fiéis, mas tal proposição foi condenada pela Igreja10A falta de autoridade pessoal do Papa não implica na perda de sua potestade pontifíciaAssim a Tese, ao postular que os papas conciliares são desprovidos de autoridade por não quererem buscar o bem comum da Igreja, apoia-se em um princípio condenado pela Igreja e, filosófica e teologicamente, errôneo. Um Papa pode ter intenções perversas em seu ministério, mesmo exteriorizando-as, mas, se definir uma doutrina e a impuser à fé da lgreja, tal doutrina será dogma infalível; de maneira análoga ao Sacerdote que consagra as Sagradas Espécies para profaná-las numa Missa negra: ainda que a intenção última do ato seja perversa, se tiver a intenção de consagrar, o Sacerdote consagra, inclusive se a intenção última com a consagração na Missa fosse manifestada objetivamente. Se, por um lado, propôs de maneira inovadora e sem fundamento que a falta de autoridade pessoal do papa implicaria na perda de sua potestade papal, Dom Guérard, por outro lado, não descartou a possibilidade de um “papa material” poder fazer uma declaração ex cathedra e impor uma doutrina infalivelmente para a Igreja crer11.

Primeira objeção: João Wycliffe se referia a um ocupante da Sé Apostólica apenas moralmente escandaloso
9. Objeção: A Tese não incorre no mesmo erro condenado de João Wycliffe, pois, ao postular que os homens que ocupam a Sé Apostólica estão privados da “autoridade” devido à falta de intenção de buscar o bem comum, a Tese não se refere a um ocupante apenas moralmente escandaloso, como o fez João Wycliffe, mas a um que deliberadamente profere heresias e impõe uma nova religião à Igreja12. Logo, é diferente a ideia que ambos têm de um ocupante da Sé Apostólica que careceria de autoridade.
10. Solução: Ainda que se referindo a tipos diferentes de ocupante da Sé Apostólica, a Tese se apoia no mesmo princípio condenado de João Wycliffe, pois o que faz um Papa ser mau é justamente o fato dele não buscar o bem comum da Igreja e atentar contra ele com seus escândalos – sejam eles doutrinais ou morais –, e são essas as causas – o fato dele não buscar o bem comum da Igreja e atentar contra ele com seus escândalos – que, segundo a Tese, o ocupante da Sé Apostólica está privado de sua potestade papal. Quanto as consequências do fato dele não querer buscar o bem comum da Igreja, como as heresias e a imposição de uma falsa religião, são irrelevantes, pois o erro de João Wycliffe e da Tese está no princípio de que o ocupante da Sé Apostólica, ao não buscar o bem comum da Igreja atentando contra o bem comum dela, fica privado de seu poder papal. Enfim, os adeptos da Tese, ao propagarem esse princípio condenado de João Wycliffe, contradizem o Concílio de Constança que condena toda e qualquer proposição de João Wycliffe e proíbe sob pena de anátema que se professe qualquer uma de suas proposições13.

Segunda objeção: a Tese não sustenta a falta de intenção como perda da potestade papal
11. Objeção: A Tese não sustenta a falta de intenção como causa de perda da potestade papal, mas como impedimento interno para receber a forma do papado, pois o eleito ao papado deve estar consciente das obrigações que ele contrai ao aceitar a eleição. Portanto, ainda que o princípio da Tese e o de João Wycliffe sejam semelhantes, a Tese toma seu princípio como condição para que o eleito esteja apto para receber a forma do papado, enquanto João Wycliffe toma seu princípio para sustentar a perda do papado e por isso foi condenado.
12. Solução: Pelo contrário, disse Dom Guérard que, com a promulgação da Declaração Dignitatis Humanae em 7 de dezembro de 1965, “há que concluir então, segundo Leão XIII, que, ao realizar este ato, o Cardeal Montini não teve a intenção de receber a Comunicação exercida por Jesus Cristo, e que então não era mais Papa formaliter”14. Assim, segundo Dom Guérard, tal princípio da Tese não só é aplicável ao impedimento para receber a forma do papado durante a eleição papal, mas é aplicável também como causa de perda do papado, ou seja, aplicável a qualquer Papa. Portanto, como se concluiu na solução anterior (ver n. 10), os princípios de ambos acabam sustentando a ideia de que a falta de autoridade pessoal (ver n. 7) do ocupante da Sé Apostólica é a causa dele ficar privado da potestade papal, que é uma ideia rejeitada pelo Concílio de Constança pelos teólogos católicos ao admitirem a possibilidade de um Papa mau que tentasse destruir a Igreja.

Terceira objeção: ninguém tem autoridade para sustentar que a Tese incorre na condenação de João Wycliffe
13. Objeção: Ainda que os princípios da Tese e de João Wycliffe convirjam a um mesmo fim, ninguém atualmente tem autoridade para afirmar que a Tese se apoia em uma proposição condenada formalmente pelo Concílio de Constança, portanto nenhum adepto da Tese está sujeito às palavras desse Concílio que “proíbe doravante a todos e a cada um dos católicos, sob pena de anátema, pregar, ensinar, ou professar fé nas proposições aqui descritas ou a qualquer outra delas”15.
14. Solução: Ainda que ninguém atualmente tenha autoridade para julgar isso, a Tese, ao se apoiar em um princípio inovador e errôneo que converge para a mesma preposição condenada de João Wycliffe, deve ser evitada por todo católico, pois, como ordena a Santa Igreja em seu Direito Canônico, “não é suficiente evitar a depravação herética, mas também é necessário abandonar com prontidão os erros que dela se aproximam, para mais ou para menos”16.

Matéria e forma aplicadas à eleição papal
15. São Roberto Belarmino, Doutor da Igreja, explica que “os Cardeais, quando elegem um pontífice, não exercem sua autoridade sobre o pontífice, pois ele ainda não o é, mas sobre a matéria, isto é, sobre a pessoa a quem se dispõe de algum modo por meio da eleição, para que receba de Deus a forma do pontificado”17. O canonista Padre Charles Augustine, O.S.B., pouco antes de aplicar analogamente o conceito de matéria e forma à eleição papal, dizendo que, para que haja o pontificado, é necessário que haja o instrumento apropriado18, se expressa no mesmo sentido que o Santo Doutor, que compara o homem eleito em um conclave a uma matéria capaz de receber a forma que o divino Artista o imporá, por lei divina19. Essa forma, a autoridade ou potestade pontifícia, é o elemento determinante que constitui o Papa como tal.

Da forma como a Tese aplica o conceito de matéria e forma
16. Poder-se-ia usar a analogia com matéria e forma ao papado de várias maneiras. A maneira como a Tese aplica tal analogia à atual situação da Sé Apostólica, que é uma situação posterior ao conclave, será discutido depois. Convém primeiro analisar como tal analogia é aplicada ao contexto de uma eleição papal.
17. Com relação a definição da forma do papado, não parece haver controvérsia com a aplicação feita pela Tese de tal analogia, mas o mesmo não se pode dizer da maneira como a Tese aplica essa analogia à matéria do papado.

Se a forma requer uma matéria apropriada
18. Uma matéria não está apta a receber uma forma qualquer20. Portanto, para um material líquido, por exemplo, um escultor não pode cinzelá-lo na forma de uma estátua; é necessário para forma uma matéria apropriada21. Santo Agostinho escreveu: “Se uma matéria não pode receber a forma imposta pelo artesão, não poderíamos dar-lhe o nome de matéria”22.

A matéria apropriada ao papado
19. No contexto de conclave, a matéria apropriada ao papado é alguém que seja “papável”, isto é, que seja elegível ao papado, que cumpra as condições de elegibilidade do Pontífice Romano, e desse modo é capaz de receber a forma do papado, isto é, a suprema jurisdição que o eleito ao papado recebe por direito divino ao aceitar a eleição. O Código Direito Canônico de 1917 (doravante “CDC”) e todos os seus comentadores ensinam unanimemente que, se uma pessoa é capaz de ser eleita Papa, “papável”, também é capaz de se tornar Papa23Entretanto, a Tese cai no absurdo de considerar como matéria, “papável”, alguém que não é capaz de receber a forma, a potestade papal.

As condições para alguém ser “papável”
20. O célebre Padre Filippo Maroto, professor de Direito Canônico no Pontifício Colégio de Santo Atanásio, consultor do Santo Ofício, que trabalhou na preparação do Código de 1917, disse: “A validade da eleição, no que diz respeito à pessoa eleita, depende apenas da lei divina – em outras palavras, nenhum outro impedimento, exceto os previstos pela lei divina, invalida a eleição de um Romano Pontífice […] Por conseguinte, para uma eleição válida de um Romano Pontífice é agora necessário e suficiente que a pessoa eleita seja: […] c) Um membro da Igreja, pois aquele que não pertence à Igreja é considerado incapaz de possuir jurisdição, especialmente jurisdição ordinária, e não pode efetivamente ser o chefe da Igreja. Por esta razão, os infiéis e os não batizados não podem de modo algum ser validamente eleito. Assim também, a própria lei divina proíbe os hereges e cismáticos do supremo Pontificadoeles devem certamente ser considerados como excluídos de ocupar o trono da Sé Apostólica, que é a mestra infalível da verdade da fé e o centro da unidade eclesiástica” (Institutiones Iuris Canonici, 2:784, 1917). Esse é o ensinamento unânime dos teólogos, como demonstrado em outro artigo24.

Primeira objeção: Uma eleição papal, ainda que inválida, deve ainda assim ser julgada pela Igreja
21. Objeção: Como disse Dom Guérard, ainda sejam inválidas, as eleições dos papas materialiter devem ser julgadas pela Igreja25, logo não temos autoridade para considerá-las inválidas antes disso.
22. Solução: Essa objeção acaba no mesmo erro da objeção respondida em outro artigo: a lei divina, como a que impede a eleição papal de um herege, só tem valor quando expressado pela lei eclesiástica, seja no Direito Canônico, seja por uma autoridade competente. Em realidade, os teólogos, ao afirmarem a invalidade da eleição papal de um herege decorrente de um impedimento de lei divina, o afirmam em virtude do próprio fato e, portanto, não admitem nenhum valor legal ou jurídico à tal eleição, uma vez que, como determinou a Santa Igreja, uma lei divina tem seu poder de lei por si mesma, ainda que não esteja expressa no Direito Canônico: “Entre as outras leis disciplinares atualmente em vigor, caso não estejam contidas explícita ou implicitamente no Código, deve ser dito que perderam sua força, a menos que sejam repetidas em livros litúrgicos, ou a menos que a lei seja de lei divina, seja ela positiva ou natural” (Código de Direito Canônico de 1917, cânone 6, 6).

Segunda objeção: ninguém é privado de um cargo sem julgamento canônico
23. Objeção: A Tese não entra em questão de heresia e tampouco nas consequências dela que foram objeto de discussão entre os teólogos, apenas sustenta que o designado legalmente não deve ser considerado privado de seu cargo, uma vez que o Código de Direito Canônico afirma que um clérigo herege pode, ainda que ilicitamente, exercer jurisdição se ele não foi sentenciado26.
24: Solução: Dom Guérard sustentava que deveria haver um processo canônico contra o papa materialiter, que consistia em um concílio, feito por Bispos residenciais, intimando-o a se converter e, se ele persistisse em seu erro, deixaria ipso facto de pertencer à Igreja e de ser papa materialiter27. Portanto, ainda que a Tese não entra em questão de heresia, o papa materialiter se encontraria na mesma situação que o Cardeal Caetano sustentou para o caso de um Papa que, como doutor privado, seria um herege notório. Mas tal situação é absurda e já foi refutada pelos teólogos e Doutores da Igreja, pois não há nada legal que se possa fazer contra um Papa, e a Tese sustenta que o papa materialiter é Papa por direito ou de acordo com a lei, então, de acordo com a Tese, restaria apenas a renúncia e a morte do papa materialiter para que a Sé fique vacante. Assim, parece ficar claro um dos motivos de Dom Guérard conjecturar um impedimento jamais sustentado pelos teólogos católicos (ver n. 8): para não entrar na questão do Papa herege que parece separar os sedevacantista e os lefebvristas, pois, por uma questão de fé, ele deveria adotar a posição sedevacantista constatando a vacância da Sé conforme ensinam unanimemente os teólogos católicos, e se o papa materialiter se encontra nessa mesma situação, que foi objeto de discussão dos teólogos, sigamos a única resposta possível para o nosso caso, que é perfeitamente exposta pelo Cônego Raoul Naz, canonista: “Resumamos, a título de conclusão, a explicação que os melhores teólogos e canonistas deram a esta dificuldade28. Não se trata de um julgamento e de uma deposição de um Papa no sentido estrito das palavras. O Vigário de Jesus Cristo não está sujeito a nenhuma jurisdição humana. Seu juiz direto e imediato é apenas Deus. Portanto, se os antigos textos conciliares ou doutrinais parecem admitir que o Papa possa ser deposto, eles estão sujeitos à distinção e à ratificação. Na hipótese, aliás inverosímil, em que o papa incorresse em heresia pública e formal, ele não seria privado de seu cargo por um julgamento dos homens, mas por seu próprio fato, uma vez que a adesão formal a uma heresia excluí-lo-ia do seio da Igreja”29.

O regulamento da eleição papal
25. Segundo o Código de Direito Canônico, a eleição papal é regulada somente pela Constituição do Papa São Pio X, Vacante Sede Apostolica de 25 de dezembro de 190430. A partir de um novo regulamento promulgado legitimamente pelo Papa Pio XII em 8 de dezembro de 1945, tal eleição passou a ser regulada somente pela Constituição Vacantis Apostolicæ Sedis do Papa Pio XII.

O regulamento da eleição papal mudado pelos “papas materiais”
26. O regulamento da eleição papal foi mudado algumas vezes pelos “papas materiais”31, que, segundo a Tese, são destituídos da jurisdição (ou do poder de governo) para legislar legitimamente. Portanto, fica evidente que uma eleição como, por exemplo, a de Bergoglio não poderia ser válida nem de acordo com a lei eclesiástica, pois tal eleição não foi feita conforme à Constituição de Pio XII, que foi o último Papa com poder para promulgar leis.

A eleição papal requeriria Cardeais válidos
27. Um dos motivos pelos quais Dom Guérard cria ser possível que a eleição de Wojtyla fosse válida era o fato de que havia Cardeais nomeados por um Papa verdadeiro, como ele confessou mais de uma vez32. Portanto, julgando apenas por esse aspecto, uma vez que atualmente não há mais nenhum Cardeal válido, a Tese não é mais uma opção válida.

Primeira objeção: O papa possui poder de ordem natural em virtude da eleição válida
28. Objeção: Como explicaram o Padre Lucien33 e Dom Sanborn34, há uma dupla finalidade da Igreja: uma na ordem sobrenatural, na qual é exercido o poder de jurisdição que Cristo confere aos sucessores dos Apóstolos, e outra na ordem natural, na qual é exercido o poder de designar proveniente dos homens para perpetuar os ofícios, e esses poderes são essencialmente distintos e podem existir separadamente35, portanto podemos crer que, conquanto seus atos magisteriais sejam inválidos por falta do poder de jurisdição, o papa materialiter possui o poder de designar, senão Cardeais, ao menos eleitores válidos para perpetuar os ofícios.
29. Solução: Essa explicação da Tese não parece ser compartilhada por Dom Guérard, que, como se disse, sustentava que todo ato dos papas materialiter eram nulos e que as eleições papais eram válidas não devido a um pretenso poder de designar validamente alheio à jurisdição, mas devido à existência de Cardeais válidos criados pelo Papa Pio XII que aceitaram tais eleições ou ao menos não contestaram a validade de tais eleições. Todavia, essa distinção entre poder de jurisdição e de delegar, abandonada também por Dom Sanborn e o RCI que passaram a defender que o poder administrativo dos papas materialiter se dá por uma jurisdição de suplência, é errônea, porque supõe que o exercício do poder administrativo pode ser feito sem supor alguma jurisdição, que os adeptos da Tese não concedem ao papa materialiter, e tal suposição é falsa, uma vez que todo exercício do poder administrativo implica jurisdição em foro externo, que por definição tem por objeto a administração e o governo externo da Igreja.

Segunda objeção: Nosso Senhor supre a jurisdição para o papa materialiter mudar tal regulamento
30. Objeção: Em vista da absoluta necessidade de perpetuar a sucessão materialiter tal como postula a Tese, deve-se crer que Nosso Senhor supre a jurisdição do papa materialiter para mudar o regulamento da eleição papal.
31. Solução: Conceder-se-ia à tal objeção, que concede demasiadamente a um líder de uma religião que tenta destruir manifesta e deliberadamente a Santa Igreja Católica, se fosse possível provar que a Tese não possui nenhum erro e fosse a única solução possível para manter de alguma forma a marca da apostolicidade, mas tanto uma coisa quanto a outra não são possíveis de serem provadas, pois, como provado por esse artigo em suas diferentes partes, a Tese contém erros, e tampouco é a única solução possível para manter de alguma forma a apostolicidade na Igreja Católica, porque, como provado mais a frente neste artigo, os adeptos da Tese, ao contrário de Dom Guérard, começaram a sustentar uma falsa noção de apostolicidade com o Padre Joseph Ratzinger usurpando o papado, e porque existe outra solução possível, como mostrarei em um outro artigo. Portanto, não existe uma tal absoluta necessidade de perpetuar a sucessão materialiter tal como postula a Tese. Além disso, parece-me razoável argumentar ainda que Joseph Ratzinger e Bergoglio não poderiam ser eleitos papas nem de acordo com a suposta lei eclesiástica vigente promulgada por um papa materialiter, pois, o regulamento da eleição papal mudado por Wojtyla não parece ser diferente do de Montini que, mais explicitamente, exigia que o eleito ao papado fosse sagrado Bispo, caso ainda não fosse, para que o conclave tenha término, e os adeptos da Tese admitem que o rito de sagração episcopal é inválido. Assim, nesse aspecto, o que impediria Ratzinger e Bergoglio de serem “papas materiais” não seria o fato em si de não serem Bispos, mas o fato de que, legalmente falando, para que eleição papal seja de fato consumada, é necessário que o que aceitou a eleição esteja apto e queira ser sagrado Bispo.

Se uma eleição papal válida pode não resultar um Papa
32. A Tese sustenta que o papa materialiter foi eleito validamente, mas não é verdadeiro Papa. Em outras palavras, é possível que a eleição papal seja feita validamente e ao mesmo tempo que não tenhamos um Papa. Esse absurdo é, no mínimo, um erro teológico. Na verdade, o Direito Canônico de 1917 e todos os seus comentadores ensinam unanimemente que, se uma pessoa é capaz de ser eleita Papa, também é capaz de se tornar Papa. Isso porque a Igreja não toma, e de fato não poderia tomar, decisões sobre o estado interno ou as intenções de uma pessoa; o que ela analisa é se os seus membros são católicos ou não, isto é, se têm a fé católica e pertencem ao Corpo Místico de Cristo externamente36. Por isso é que os teólogos comumente confundem ser eleito com possuir jurisdição papal ou ser papa, como vemos quando João de Santo Tomás afirma: Não há diferença real entre a proposição: Este homem é legitimamente eleito e Este homem é papa, pois ser aceito como Soberano Pontífice e ser Soberano Pontífice são a mesma coisa; assim como é o mesmo que algo seja definido e que a definição seja legítima37, ou como quando o Padre Cappello define eleiçãoA eleição propriamente dita é aquela da qual o candidato efetivamente adquire o direito, ou seja, o exercício da jurisdição38.

Objeção: Ser eleito validamente e tomar posse do pontificado são coisas distintas
33. Objeção: Essa distinção entre ser eleito e ser papa deve ser entendida conforme o exemplo exposto por Dom Sanborn ao explicar a Tese de Dom Guérard: Assim, na primeira terça-feira do mês de novembro, o novo presidente dos Estados Unidos é legal e legitimamente eleito, maser não tem o poder, não é presidente. No dia 20 de janeiro começa a sê-lo, pois nesse dia recebe o poder. Desde novembro a janeiro é presidente materialmente, pois foi oficialmente designado. Em janeiro, é presidente formalmente.
34. Solução: A eleição papal e a eleição presidencial são distintas inclusive quanto à possessão do poder de governo, pois a eleição presidencial e a possessão do poder de governo ocorrem em diferentes tempos estabelecidos pela lei, mas na eleição papal a possessão do poder de governo, chamado jurisdição, ocorre imediatamente após o fim da eleição papal, conforme especificado pelo lei eclesiástica, no Código de Direito Canônico, cânone 219: “O Romano Pontífice, legitimamente eleito, imediatamente após aceitar a eleição, obtém por lei divina o pleno poder da jurisdição suprema”.

A sucessão apostólica
35. “A sucessão apostólica pode ser definida como: a pública, legítima, solene e nunca interrompida substituição (suffectio) de pessoas no lugar dos Apóstolos para governar e alimentar a Igreja (Cercia, I, p. 223)”. Os teólogos a distinguem em diversos sentidos. No sentido de ministério, a sucessão apostólica distingue-se entre legítima (ou formal) e ilegítima (ou material). “Um sucessor formal, ou legítimo, não só substitui o lugar de seu predecessor, mas também recebe a devida autoridade para exercer as funções de seu ofício com força vinculativa na sociedade”39. Assim, um sucessor material, ou ilegítimo, é aquele que não tem “a devida autoridade para exercer as funções de seu ofício com força vinculativa na sociedade”40, porque “assume a posição oficial de outro contrário às leis”41, ou porque, embora tenha a Ordem Episcopal, não ocupa uma posição oficial, como é o caso dos Bispos titulares42 ou os atuais Bispos tradicionalistas43. Portanto, “ainda que exista ordem válida, não há verdadeira apostolicidade onde falta jurisdição”44.

Se a Sucessão Apostólica material depende da Ordem Episcopal
36. Como disse Dom Guérard, a sucessão apostólica material depende ao menos de Ordem Episcopal válida, assim, nesse sentido, o sucessor de Wojtyla, o Padre Joseph Ratzinger, que foi “sagrado” através de um rito episcopal inválido45, não pode perpetuar a sucessão apostólica material, sendo, no dizer de Dom Guérard, um mero figurante: “A mesma observação se aplica aos ‘ocupantes’ da Sé Apostólica que sucederam ao Cardeal Montini, isto, apenas na medida em que uma ‘hierarquia’ somente materialiter pode se perpetuar. Uma tal perpetuação não é ex se impossível. Mas requer expressamente Sagrações Episcopais que sejam certamente válidas. E como o novo rito é duvidoso, os ‘ocupantes’ (da Sé Apostólica) em breve não serão mais que ‘figurantes’. Mons. Wojtyla é, a esse respeito, pelo menos um eminente precursor46. Portanto, segundo o seu próprio autor, a Tese tornou-se obsoleta a partir do momento em que o Padre Joseph Ratzinger foi eleito papa.

Primeira objeção: Dom Guérard não disse que um figurante não é um papa materialiter
37. Objeção: Disse o Padre Ricossa: “Notamos que Dom Guérard não escreve que um tal eleito deixaria de ser ‘papa material’, mas que seria ‘figurante’, o que não é a mesma coisa”.
38. Solução: Com todo respeito ao Padre Ricossa, mas essa objeção é um sofisma sem igual. Dom Guérard afirmou que uma tal perpetuação requer expressamente Sagrações Episcopais, e que, caso o sucessor de Wojtyla não possuísse uma sagração certamente válida, ele não poderia perpetuar a sucessão materialiter, e é justamente por um tal sucessor não ser papa materialiter que, tal sucessor, seria um figurante.

Segunda objeção: o Papa Pio XII disse que até um leigo pode ser papa
39. Objeção: Disse o Papa Pio XII: “Se um leigo fosse eleito Papa, só poderia aceitar a eleição na condição de estar apto a receber a ordenação e disposto a ser ordenado; o poder de ensinar e governar, bem como o carisma da infalibilidade, ser-lhe-iam concedidos instantaneamente, mesmo antes da ordenação”47. Logo, é possível ser Papa não sendo Bispo, de maneira que a sucessão apostólica material é mantida ao menos pelo direito legal que o eleito validamente ao papado adquiriu.
40. Solução: Concede-se que alguém que não é Bispo possa ser Papa, mas somente na medida em que o eleito esteja apto para receber a ordenação episcopal e disposto a ser ordenado, conforme disse o Papa Pio XII, de modo que os que estão impedidos por lei divina aceitariam em vão uma eleição inválida em si mesma (ver n. 22), e, se o eleito possui impedimento invalidante, então não contrai qualquer direito legal, uma vez que a eleição foi inválida.

É uma verdade de fé que a Igreja seja uma sociedade perfeita
41. Em seu Manual de Teologia Dogmática, o célebre teólogo Monsenhor Hervé demonstrou que é uma verdade de fé divina que a Igreja seja uma sociedade perfeita: “Asserção: ‘A Igreja é uma sociedade perfeita’ (De fé divina). A. Prova-se a tese pela Escritura. Desde a própria instituição de Cristo, a Igreja possui todos os elementos de uma sociedade perfeita. Logo: 1) Não depende de mais nada: Se a Igreja dependesse de outra ‘sociedade, estaria subordinada a essa sociedade ou como inferior à superior ou como parte do todo. Nenhuma parte pode ser admitida, porque o fim da Igreja é o mais universal, pois é tarefa própria de Deus trazer santidade a todos no único aprisco da Igreja’ (Ita De Groot, p. 134, b). 2) É suficiente a si mesma para atingir o seu fim: a) Para o que for necessário para atingir o seu próprio fim, Cristo contribuiu para isso: ele mesmo deu o fim, portanto forneceu todos os meios necessários para o fim; b) Como atestam as Escrituras (Mt 28, 19; 16, 18 seg.; Jo. 20, 22-23; 21, 17 seq.), Cristo entregou diretamente a si mesmo e somente à Igreja todos os instrumentos necessários para a salvação eterna, isto é, o poder mais universal, mais eficaz e absolutamente independente de qualquer vontade que não seja a de Deus, para ensinar, governar e santificar todos os homens até o fim do mundo”48. Não à toa a Santa Igreja já condenou a preposição que afirma que a Igreja não é uma sociedade perfeita (cf. DS. 2919).

A Tese acaba por negar que a Igreja seja uma sociedade perfeita
42. A Tese no fim chega à mesma conclusão que chegam os lefebvristas quanto à causa pela qual a Igreja pode ser restaurada: a conversão dos modernistas. Assim, deforma a doutrina católica e criam mais hipóteses absurdas, como a de que há duas igrejas, que é o que muitos lefebvristas fazem, ou a de que há duas religiões na Igreja Católica, que é o que os adeptos da Tese fazem. Isso tudo são absurdos doutrinários contrários à fé católica. O católico deve afirmar a doutrina católica: a Igreja é una e é uma sociedade perfeita, sua existência não pode depender de uma sociedade alheia a ela e a falsa igreja ou a religião dos modernistas não pertencem à Igreja Católica. Portanto, sustentar que a restauração da Igreja Católica depende da seita acatólica, como a seita Novus Ordo, é uma heresia, pois isso é a negação da doutrina de fé de que a Santa Igreja Católica Apostólica Romana é uma sociedade perfeita.

Primeira objeção: o Novus Ordo não é uma seita acatólica
43. Objeção: Os próprios sedevacantistas reconhecem na prática que o que chamam de igreja Novus Ordo não é uma seita acatólica, uma vez que não exigem a abjuração, obrigatória aos convertidos de seita acatólica, para aqueles que se convertem do Novus Ordo à tradição. Portanto, não há razão para tê-la como seita acatólica.
44. Solução: Em um artigo sobre o atual estado da Igreja de Cristo, o Padre John Okerulu responde a isso da seguinte forma: Toda a hierarquia Novus Ordo incorreu em heresia pública por causa de sua adesão pública, manifesta e pertinaz às heresias do Concílio Vaticano II. Tendo feito esse ato externo, isto é, aderindo conscientemente a uma seita ou a suas falsas doutrinas, há uma violação externa da lei e o dolus em foro exterior é presumido49. Essa é uma base sólida para o argumento sedevacantista. Por essa razão, a maioria dos bispos e sacerdotes católicos tradicionalistas certamente exigirão uma abjuração, por exemplo, ao Ratzinger se ele se converter. Ouvi em primeira mão os mais ardentes defensores da Tese admitirem isso. Mas eles não exigem essa abjuração para os leigos católicos, e a base sólida para essa prática é conforme a explicação abaixo. Nem todos os que pertencem às seitas acatólicas devem ser considerados como acatólicos. É comumente considerado por todos os teólogos e canonistas que todas as crianças, que são batizadas validamente em seitas acatólicas antes de alcançarem o uso da razão, são membros da Igreja50. Antes do Código (de 1917), era disputado se as crianças que atingiram a idade da razão incorriam em excomunhão automática ou não, mas o Código resolveu a disputa insistindo que elas estão livres de contrair qualquer censura até atingirem a puberdade (14 anos). Assim, ao contrário do que alguns ainda sustentam, as crianças, validamente batizadas em seitas acatólicas que atingiram o uso da razão, se voltarem à Igreja, não devem fazer nenhuma abjuração. Elas não precisam ser absolvidas de qualquer excomunhão (cf. Cânone 2230), mas devem fazer uma simples profissão de fé51. O canonista Augustine explica a razão com este princípio geral da lei: “Ignorância de fato e não de lei, escusa” (para detalhes, veja o apêndice 1). Assim, embora o cânone 2200, § 2, diga que “tendo acontecido a violação externa da lei, o dolus (dolo) é presumido em foro externo”, acrescenta: “até que o contrário seja provado”52. É fácil ver como uma criança, embora tenha atingido a idade da razão, possa ignorar o fato de que está em uma igreja que não seja católica. Esse mesmo princípio adotado pelo Código no caso de crianças que atingiram a idade da razão e foram batizadas em seitas acatólicas, pode – e de fato é – aplicado pelo clero tradicionalista católico aos membros da seita Novus Ordo que, de maneira sincera, pensam que a seita Novus Ordo é a Igreja Católica, pelas seguintes razões: 1) a seita Novus Ordo mantém o nome de católica; 2) a hierarquia da seita Novus Ordo apresenta uma falsa reivindicação para as Sés e os ofícios da Igreja Católica. A maioria dos simples fiéis da seita do Novus Ordo desconhece os fatos concernentes às mudanças feitas pelo Novus Ordo, na doutrina, no culto e na disciplina, que, como vimos, constituem a instituição do Novus Ordo como uma nova seita. Muitos leem confortavelmente as vidas dos santos e a história da Igreja, mantendo a confiança de que pertencem à mesma Igreja! Com o que foi exposto acima, os fiéis leigos da seita Novus Ordo são justamente presumidos como enganados, ao invés de pertinazes em aderir às heresias do Vaticano II. No entanto, a Igreja ordena a seu clero que solicite uma profissão de fé, como o retorno à Igreja Católica53.

Segunda objeção: a hierarquia Novus Ordo faz parte da Igreja
45. Objeção: Apesar de não ser membro de fato (de facto) da Igreja, que é a sociedade dos que professam a mesma fé, o clero Novus Ordo ainda é membro de direito (de iure) da Igreja e é nesse sentido que, como membro de direito, tal clero perpetua a hierarquia material da Igreja, de modo que é falso afirmar que a Tese sustenta que a perpetuação da hierarquia da Igreja depende de não-membros dela, como aconteceria se o clero Novus não pertencesse à Igreja de modo algum, nem de fato e nem de direito.
46. Solução: Como demonstrado anteriormente, se não há em realidade o direito ao exercício da jurisdição papal, que é um direito conferido para o que foi eleito validamente ao papado, não houve, portanto, eleição papal (ver n. 32), e assim tampouco o eleito contrai alguma característica jurídica de membro da Igreja. Portanto, se sairmos desse looping de petição de princípio que a Tese tenta se sustentar e julgarmos a realidade das coisas, concluimos imediatamente que a Tese de fato incorre em heresia ao negar a verdade de fé de que a Igreja Católica é uma sociedade perfeita, uma vez que a Tese acaba sustentando que a perpetuação da hierarquia católica permanece num conjunto de não-católicos que constituem uma seita acatólica e que de modo algum são membros da Igreja Católica.

A Tese nega a doutrina católica de que as quatro marcas da Igreja andam juntas
47. Porém, tal como todos as posições que não são a sedevacantista ou a errônea dos ditos conclavistas, ao sustentar que a religião Novus Ordo, que evidentemente é uma sociedade essencialmente distinta da Igreja Católica, perpetua a sucessão apostólica, que é uma marca essencial da Igreja de Cristo, a Tese incorre não só em heresia por negar a verdade de fé que a Igreja Católica é uma sociedade perfeita, como já provamos anteriormente, mas nega ainda outro ponto que é absolutamente certo na teologia católica: as 4 marcas da Igreja de Cristo andam todas juntas. Onde está a apostolicidade, está também a catolicidade, a unidade e a santidade, conforme ensinam os teólogos. Tomemos como exemplo o que disse Monsenhor Charles Journet54, que, após explicar o conceito dessas 4 notas da Igreja de Cristo, pontuou esta verdade mais explicitamente: “Por certo, as propriedades essenciais não podem ser separadas da essência (da Igreja); elas são distintas da essência de maneira conceitual, mas idênticas a ela na realidade. Onde há a apostolicidade, há também a unidade, a catolicidade e a santidade, e vice-versa. Isso também se aplica às notas, que são simplesmente as propriedades ‘na medida em que estas são externamente aparentes e conhecidas’. Uma nota é suficiente para indicar a verdadeira Igreja, mas onde está uma única nota, há todas as outras. No entanto, é possível considerá-las separadamente, pois, embora idênticas na realidade, elas diferem conceitualmente. São múltiplos aspectos de uma mesma realidade demasiadamente rica para serem apreendidos em um único conceito”. Portanto, se para os adeptos da Tese a religião Novus Ordo mantém a apostolicidade da Igreja, eles devem então provar que a religião Novus Ordo mantém também a catolicidade, a unidade e a santidade da Igreja Católica55.

Notas

  1. Conquanto não seja propriamente uma tese, mas uma mera hipótese. 
  2. Instituto Católico Romano, cujo atual superior geral é o Bispo Donald J. Sanborn. 
  3. Sagrado Bispo em 7 de março de 1981 por Dom Pierre Martin Ngo-Dinh-Thuc, Arcebispo emérito de Hué. 
  4. Que depois aceitou o Vaticano II e se tornou um ferrenho defensor do “Magistério” conciliar. 
  5. Cahiers de Cassiciacum, nº 1, pg. 16. 
  6. Como exposto no primeiro Cahiers de Cassiciacum, poder-se-ia dividir em partes a jurisdição, que não se limita à da potestas regendi, mas as demais partes são de algum modo um tipo de governo e, portanto, jurisdição e governo podem ser confundidos, como de fato o são no Código de Direito Canônico de 1917. 
  7. Juan Antonio Widow, professor de “Metafísica e Filosofia Política” na Universidade Católica de Valparaíso, em seu livro, “El hombre: animal político – El orden social: princípios e ideologias” (p. 42), demonstra que “poder” e “autoridade” não são a mesma coisa, e ilustra a distinção com este exemplo: “A relação entre autoridade, enquanto sabedoria prática, e governo é análoga, pois, é a que há entre a arte da navegação e a ação de dirigir o navio. O navegador pelo ofício é aquele que tem a capacidade de dirigir o navio – daí vem, especificamente, o termo “governo” – e, por isso, a capacidade de ensinar aos outros esta arte e de dar conselhos a este respeito: ele tem a autoridade, pois nele reside o conhecimento próprio do ofício. Mas não é porque ele tem autoridade que ele também tem o poder de governar tal navio: ele só a tem se esse poder em particular tiver sido reconhecido por aqueles que têm o poder de fazê-lo (por exemplo, os proprietários do navio). É claro, portanto, que mesmo que o exercício de um poder pressuponha – ou recomende – um certo grau de autoridade naquele que o exerce, a posse de um e de outro não é a mesma coisa”. 
  8. O que é bastante irônico, tendo em vista que hoje os adeptos da Tese, especialmente os clérigos ligados a Dom Sanborn, acusam os que não aceitam tal Tese, como fizeram contra os falecidos Padre Anthony Cekada Cekada e Dom Daniel L. Dolan, de não possuírem suficiente conhecimento de filosofia escolástica. 
  9. De Romano Pontifice, lib. II, cap. XXIX. Os Padres jesuítas Wernz e Vidal (Ius Canonicum, vol. II, p. 520), citando Suarez (Defensio Fidei Catholicae, lib. IV, cap. 6, n.º 17-18), admitem que é lícito resistir a um mau Papa. 
  10. “Ex Concilio Constantiensi manifesto patet quinam fuerint errores loannis Wiclefi et loannis Huss. Etenim in Sess. VIII dannatur sequens Wiclefi articulus qui est octavus: «Si Papa sit praescitus et malus, non habet potestatem super fideles»” [Do Concílio de Constança fica evidente quais foram os erros de João Wycliffe e João Huss. Com efeito, na Sess. VIII é dado o seguinte artigo de Wycliffe, que é o oitavo: “Se o Papa é conhecido de antemão como mau, ele não possui poder sobre os fiéis”] (em: Cappello, De Curia Romana iuxta reformat, II, Errores loannis Wiclefi et loannis Huss). 
  11. “Paulo VI, que foi Papa realmente, ainda que “materialmente”, teria em si mesmo o ato do carisma de infalibilidade, se tivesse feito um ato do Magistério extraordinário; mas escolheu não o fazer. Em outras palavras, o carisma da infalibilidade pertence à pessoa singular do papa; e o exercício é assegurado, se as condições especificadas pelo Pastor Aeternus forem cumpridas. O Papa que o é apenas materialiter é, a este respeito, realmente papa. Goza do carisma, se o exercer nas condições exigidas, seja qual for a intenção ou a ausência de intenção que não diga respeito a esse exercício” (Cahiers de Cassiciacum, nº 1, página 11). 
  12. Esse é um dos argumentos usados por Dom Sanborn: “os papas conciliares impõem uma nova religião à Igreja, logo eles não podem ser verdadeiros papas”. Assim, os adeptos da Tese que seguem Dom Sanborn chegam a postular que há atualmente duas religiões na Igreja Católica, semelhantemente aos lefebvristas que postulam que há atualmente duas igrejas que não se excluem absolutamente. Voltarei a esse ponto na segunda parte. 
  13. Papa Martinho V, Concílio de Constança, sessão 15, 6 de julho de 1415: “Os livros e folhetos de João Wycliffe, de maldita memória, foram cuidadosamente examinados pelos doutores e mestres da Universidade de Oxford. […] Este Santo Sínodo, por conseguinte, em Nome de Nosso Senhor Jesus Cristo, repudia e condena, por este decreto perpétuo, todas e cada uma em particular das proposições anteriormente mencionadas; e proíbe doravante a todos e a cada um dos católicos, sob pena de anátema, pregar, ensinar, ou professar fé nas proposições aqui descritas ou a qualquer outra delas” (Decrees of the Ecumenical Councils, vol. 1, pp. 421-422). 
  14. “Em 7 de dezembro de 1965, o Cardeal Montini promulgou, comprometendo pelo menos (cf. 3) o Magistério ordinário universal, uma proposição em relação à ‘liberdade religiosa’ que supõe oposição de contradição com a doutrina infalivelmente definida por Pio IX na Encíclica ‘Quanta Cura’ ligada ao ‘Syllabus’ (8/12/1864). Há que concluir então, segundo Leão XIII, que, ao realizar este ato, o Cardeal Montini não teve a intenção de receber a Comunicação exercida por Jesus Cristo, e que então não era mais Papa formaliter” (Dom Guérard des Lauriers, em entrevista ao Instituto Mater Boni Consilii, na Revista Sodalitium, nº 13). 
  15. Decrees of the Ecumenical Councils, vol. 1, pp. 421-422. “Alguns hereges erraram ao dizer que um verdadeiro Papa não pode ser eleito a menos que seja honesto; e eles confirmam a afirmação do fato de Cristo, que primeiro questionou Pedro sobre seu amor; João Wycliffe e John Hus, cuja doutrina absurda foi proscrita no Concílio Const. Sess. 8 e 15. E merecidamente; pois o poder de jurisdição e ordem não pressupõe necessariamente graça e inocência no sujeito” (Cappello, De Curia Romana iuxta reformat, vol. II, 1912, p. 545). 
  16. Cânone 1324. 
  17. De Romano Pontifice, lib. II, cap. XXX. 
  18. Cf. A Commentary on the New Code of Canon Law by The Rev. Chas. Augustine, O.S.B., 1919, vol. V, p. 15-16. 
  19. “O Romano Pontífice, legitimamente eleito, imediatamente após aceitar a eleição, obtém por lei divina o pleno poder da jurisdição suprema” (Código de Direito Canônico, Cânone 219). 
  20. Cf. Aristóteles, Physique, II, 2, 194 b 9. 
  21. Aristóteles, De anima, II, 2, 414 a 25. 
  22. Santo Agostinho, De natura boni, XVIII, 18. 
  23. Código de Direito Canônico, cânone 219: “O Romano Pontífice, legitimamente eleito, imediatamente após aceitar a eleição, obtém por lei divina o pleno poder da jurisdição suprema”. Pio XII também ensinou na sua Vacantis Apostolicæ Sedis 1945, § 101: “Tendo obtido este consentimento dentro do prazo, na medida do necessário, determinado pelo juízo prudente dos cardeais, aquele que é eleito através do maior número de votos, é imediatamente o verdadeiro Papa, e de fato adquire e pode exercer plena e absoluta jurisdição sobre todo o mundo” (AAS 3/1946, p. 97). Além disso, o Padre John Berthram O’Connell escreve na sua The Celebration of Mass, que o padre deve mencionar o nome do Papa no Cânone “assim que a sua eleição for anunciada” (O’Connell 1940, 87). 
  24. Veja o nosso artigo intitulado “A eleição ao papado de um herege público é inválida por lei divina”, disponível https://www.zelanti.net/pt-BR/posts/a-eleicao-ao-papado-de-um-herege-publico-e-invalida-por-lei-divina.
    Quanto às objeções que os adeptos da Tese poderiam levantar contra essa doutrina comum dos teólogos, que eles contradizem, veja o nosso artigo intitulado “Resposta às objeções dos que negam que a eleição ao papado de um herege público seja inválida por lei divina”, disponível https://www.zelanti.net/pt-BR/posts/resposta-as-objecoes-dos-que-negam-que-a-eleicao-ao-papado-de-um-herege-publico-seja-invalida-por-lei-divina. 
  25. “Ora, a existência de um eventual obstáculo, descoberto a posteriori, seja no ‘Conclave’ que elegeu, seja na pessoa assim eleita, não é suficiente para negar que esta seja, pelo menos provisoriamente, ‘papa’ materialiter. Pois um dado certo, mas que não é de ordem ontológica, não pode ser imanente às mesmas normas divinas. Um tal dado não pode então ter valor e força na Igreja senão em virtude de uma ordenação e de uma promulgação feita pela autêntica Autoridade da Igreja” (Dom Guérard des Lauriers, em entrevista ao Instituto Mater Boni Consilii, na Revista Sodalitium, nº 13). 
  26. “Os atos de jurisdição, seja para o foro externo ou interno, colocados por um excomungado são ilícitos; e se uma sentença condenatória ou declaratória tiver sido estabelecida, eles também são inválidos com a devida consideração à prescrição do cânone 2261, § 3; caso contrário, eles são válidos e, de fato, são até mesmo lícitos se forem procurados por um membro dos fiéis, de acordo com a norma do mencionado cânone 2261, § 2” (Código de Direito Canônico de 1917, cânone 2264). 
  27. Resposta de Dom Guérard à pergunta feita de como cessaria a vacância formal da Sé Apostólica: “O processo normal, canônico, é conhecido. O que resta de Autoridade na Igreja militante, se o Papa cai em heresia ou cisma, é a pessoa moral (doravante designada como M) constituída pelo conjunto hierárquico dos Bispos residenciais que professam (então!) integralmente a Fé Católica. Esta pessoa moral M deve dirigir ao ‘papa’ (ex Papa) uma intimação e deve convocar o Conclave, o que assegura pelo menos em potência a Sucessão apostólica, considerando-a formaliter (é o que acontece quando morre um Papa, em particular se o Conclave devidamente convocado deve ser diferido por causas extrínsecas). Se o ‘papa’ persiste em seu erro, é ipso facto fora da Igreja e não é então mais papa em tudo, nem mesmo materialiter” (Dom Guérard des Lauriers, em entrevista ao Instituto Mater Boni Consilii, na Revista Sodalitium, nº 13). 
  28. Bellarmin, De Romano Pontifice, lib. II, c. XXX; Bouix, De papa, t. II, Paris, 1869, p. 653; Wernz-Vidal, Jus Decretalium, l. VI, Jus poenale ecclesiae catholicae, Prati, 1913, p. 129. 
  29. Tratado de Direito Canônico, 1946, t. IV, col. 1159. 
  30. Cânone 160, C.D.C. 
  31. Foi mudada por Paulo VI no dia 1 de outubro de 1975, pela Constituição Romano Pontifici eligendo; foi mudada por João Paulo II no dia 22 de fevereiro de 1996, pela Constituição Universi Dominici gregis; foi mudada duas vezes por Bento XVI, a primeira vez no dia 11 de junho de 2007, pelo Motu Proprio De electione romani pontificis, e a segunda no dia 22 de fevereiro de 2013, pelo Motu Proprio Normas Nonnulas. 
  32. “Não é impossível que o Conclave, do qual o Cardeal WOJTYLA foi eleito, tenha sido válido. Alguns canonistas pensam assim, e o argumento deles é sério. O Conclave incluiu uma dúzia de Cardeais que certamente possuíam esse título desde que o receberam antes que o Cardeal MONTINI ocupasse a Sé Apostólica. Esses autênticos Cardeais constituíram, dentro da Assembleia, um verdadeiro Conclave. Mas eles ‘reconheceram’ a eleição. Isso pode ser interpretado de duas maneiras. Ou esses Cardeais, pelo menos dois terços deles, deram seus votos ao Cardeal WOJTYLA, ou não. No primeiro caso, é provável que o Conclave seja válido. Na segunda, esses Cardeais simplesmente ‘reconheceram’ o resultado de uma eleição na qual não participaram, mas não vemos que isso seja suficiente para validar essa eleição. O fato de estar reunido em um Conclave para eleger um Papa e, portanto, sem ser um com o Papa, não autoriza os Cardeais que são membros do Conclave a validar a nomeação de falsos Cardeais” (Dom Guérard des Lauriers, Cahiers de Cassiciacum 3-4, p. 144, publicado em 1980). “Por enquanto, a Igreja está ‘ocupada’ e em estado de privação (mise en état de privation). W. [Monsenhor Wojtyla] foi devidamente eleito (eu o considero válido a menos que se possa provar o contrário) por um conclave que consistia em dez verdadeiros cardeais (pelo menos eles não protestaram contra a eleição), então ele ocupou a posse da Sé papal. Desta forma, ele é o Papa Materialiter (de acordo com as circunstâncias jurídicas externas). No entanto, existem outras infrações para a obtenção do cargo, W. tem mantido continuamente a heresia. É evidente que W. inflige uma ferida ao ‘bem comum’ na Igreja que agora detém esses mesmos erros. Como tal, com base no direito natural, metafísico e jurídico, W. é incapaz de exercer autoridade. Concedido à lei natural, que em última instância vem diretamente do próprio Deus, W. não tem autoridade factual. Ele não é capaz de ser Papa formaliter (no verdadeiro sentido). Ele não pode ser obedecido porque seus pseudo-decretos são nulos” (Dom Guérard des Lauriers, publicado em janeiro de 1984 na revista sedevacantista SAKA-Informationen). 
  33. Cf. “La situation actuelle de l’autorité dans l’Église: la thèse de Cassiciacum”, pelo Padre Bernard Lucien. 
  34. Cf. “Explanation of the Thesis of Bishop Guérard des Lauriers”, por Dom Donald J. Sanborn. 
  35. “Por exemplo, os eleitores têm o poder de designar, mas não têm o poder de governar” (Dom Donald J. Sanborn, ibidem). 
  36. Esse parágrafo é um dos motivos encontrados no artigo de Saint Gertrude the Great (SGG) para explicar o porquê chamam a Tese de um erro teológico. Dão por nota as seguintes citações:
    O Código de Direito Canônico (CDC), cânone 219: “O Romano Pontífice, legitimamente eleito, imediatamente após aceitar a eleição, obtém por lei divina o pleno poder da jurisdição suprema”. Pio XII também ensinou na sua Vacantis Apostolicæ Sedis 1945, #101: “Tendo obtido este consentimento dentro do prazo, na medida do necessário, determinado pelo juízo prudente dos cardeais, aquele que é eleito através do maior número de votos, é imediatamente o verdadeiro Papa, e de fato adquire e pode exercer plena e absoluta jurisdição sobre todo o mundo” (AAS 3/1946, p. 97). Além disso, o Padre John Berthram O’Connell escreve na sua The Celebration of Mass que o padre deve mencionar o nome do Papa no Cânone “assim que a sua eleição for anunciada” (O’Connell 1940, 87).
    Santo Tomás de Aquino escreve na Summa Theologiæ (IIa IIæ, Pergunta 60, artigo 2, resposta à Objeção 1): “Com estas palavras o nosso Senhor proíbe o julgamento precipitado que é sobre a intenção interior, ou outras coisas incertas, como afirma Agostinho”. Mons. van Noort também declara: “Mais uma vez, não faz diferença se uma pessoa que quebra os laços da Comunhão Católica o faz de boa-fé ou de má-fé; em qualquer dos casos, deixa de ser membro da Igreja. A inocência ou culpa das partes envolvidas é puramente uma questão interna, puramente uma questão de consciência; não tem relação direta com a questão de um dos laçaos externos e sociais necessários para ser membro” (Van Noort 1959, 244).
    O referido artigo de Saint Gertrude the Great (SGG) está disponível traduzido para o português em: https://www.seminariosaojose.org/artigos/breve-explica%C3%A7%C3%A3o-do-porqu%C3%AA-de-n%C3%B3s-rejeitarmos-a-tese-de-gu%C3%A9rard-des-lauriers 
  37. Cursus Theologicus, t. VI, q. 1-7, disp. VIII, art. II. 
  38. De Curia Romana iuxta reformat, vol. II, 1912, pg. 169. 
  39. Rev. Sylvester Berry, The Church of Christ: An Apologetic and Dogmatic Treatise. St. Louis: Herder, 1927. Disponível em: https://archive.org/details/TheChurchOfChristAnApologeticAndDogmaticTreatiseBerryRev.E.Sylvester5729.o 
  40. Ibidem. 
  41. Ibidem. 
  42. São Bispos que, diferentemente dos Bispos residenciais, não ocupam uma posição oficial e tampouco possuem jurisdição na Igreja. 
  43. Neste artigo não entrarei no porquê os Bispos tradicionalistas são legítimos, apesar de não serem sagrados conformes às leis previstas no Direito Canônico e de não ocuparem posições oficiais. O Padre Anthony Cekada explicou suficiente e cabalmente o porquê os Padres e Bispos tradicionalistas são legítimos e administram Sacramentos de maneira lícita em seu artigo “Traditional Priests, Legitimate Sacraments”. Disponível em: https://controversiacatolica.com/2019/10/26/sacerdotes-tradicionais-sacramentos-legitimos 
  44. Rev. Thomas Cox, The Pillar and Ground of the Truth. Chicago: Hyland, 1900. 
  45. Praticamente todos os adeptos da Tese admitem que o rito de sagração episcopal imposto em 1968 por Montini é, para dizer o mínimo, duvidoso, e, portanto, deve-se tê-lo como inválido, conforme se vê pela teologia sacramental: um sacramento duvidoso deve ser tido como um sacramento inválido. Ademais, para um estudo completo sobre a invalidade de tal rito, ver os artigos do Padre Anthony Cekada. O principal, encontra-se disponível em: https://www.seminariosaojose.org/artigos/a-invalidade-do-rito-de-sagracao-episcopal-de-1968 
  46. Dom Guérard des Lauriers, em entrevista ao Instituto Mater Boni Consilii, na Revista Sodalitium, nº 13. 
  47. Congresso Mundial para o Apostolado dos Leigos, realizado em Roma, a 5 de outubro de 1957. 
  48. Manuale theologiae dogmaticae, 1949, vol. I, De Revelatione Christiana – De Ecclesia Christi – De fontibus Revelationis. 
  49. Cânone 2200, n. 2. 
  50. Berry, Church of Christ, página 223. 
  51. Santo Ofício, 8 de março de 1882 (collect de P.F II, n.1566) como citado por Stanislaus Woywood, O.F.M. em A Practical Commentary on the Code of Canon Law, vol. II, n. 2156, página 466; Bento XIV “Singulari nos”, 9 de fevereiro de 1749. “Temos a certeza de que os batizados pelos hereges são separados da Igreja e privados de todas as bênçãos desfrutadas por seus membros, se tiverem chegado à idade da discrição E TEREM ADERIDO AOS ERROS DA SUA SEITA”. “Convertidos com menos de 14 anos de idade, não fazem a abjuração formal e não são objetos da censura. Se tiverem atingido a idade da razão, eles fazem uma simples profissão de fé, por exemplo, recitando o Símbolo dos Apóstolos” (Fortescue & O’Connell, The Ceremonies of the Roman Rite Described, Londres, Burns & Oates, 1962, página 413). 
  52. Augustine, Commentary, vol. VIII, pág. 23. 
  53. A Defense of the Theological Sedevacantist Position by Rev. John Okerulu, disponível em: https://www.strcnigeria.org/wp-content/uploads/2022/12/A-Defense-of-the-Theological-Sedevacantist-Position.pdf 
  54. The Church of the Word Incarnate, páginas 530-531. 
  55. E o mesmo vale para os demais R&Rs, os lefebvristas. Aliás, especialmente para os lefebvristas que tentam atacar a posição sedevacantista alegando que ela iria contra a sucessão apostólica e a visibilidade da Igreja, que é manifestada através das 4 marcas da Igreja, recordemos o que explicava Dom Lefebvre aos seus seminaristas: “Onde está a Igreja visível? A Igreja visível se reconhece pelos sinais que sempre deram para a sua visibilidade, que são: UNA, SANTA, CATÓLICA E APOSTÓLICA. Pergunto-vos: onde estão as verdadeiras marcas da Igreja? Elas estão na Igreja oficial (não se trata da Igreja visível, é a Igreja oficial) ou em nós, no que nós representamos, no que somos? É claro que somos nós que mantemos a UNIDADE da fé, que desapareceu da Igreja oficial. Um bispo acredita nisso, o outro não acredita nisso, a fé é diversa, seus abomináveis catecismos comportam heresias. Onde está a unidade da fé em Roma? Onde está a unidade da fé no mundo? Fomos nós que a guardamos. A unidade da fé realizada no mundo inteiro é a CATOLICIDADE. Ora, esta unidade da fé no mundo inteiro já não existe, portanto já não existe praticamente catolicidade. Em breve haverá tantas igrejas católicas como bispos e dioceses. Cada um tem à sua maneira de ver, de pensar, de pregar, de fazer o seu catecismo. Já não há catolicidade. A APOSTOLICIDADE? Eles romperam com o passado. Se fizeram alguma coisa, foi isso. Eles não querem mais o que se passou antes do Concílio Vaticano II. […] Apostolicidade: nós somos unidos aos apóstolos pela autoridade. Meu sacerdócio vem dos Apóstolos; o vosso sacerdócio vem dos Apóstolos. Somos os filhos daqueles que nos deram o episcopado. Nosso episcopado descende do Santo Papa Pio V e por ele remontamos aos Apóstolos. Quanto à apostolicidade da fé, nós cremos a mesma fé que os apóstolos. Não mudamos nada e não queremos mudar nada. E depois, a SANTIDADE. Não vamos elogiar-nos nem nos louvar. […] Tudo isso mostra que somos nós que temos as notas da Igreja visível. Se hoje ainda há visibilidade da Igreja, é graças a vós. ESTAS MARCAS JÁ NÃO SE ENCONTRAM NOS OUTROS. Neles já não há unidade da fé, mas a fé que é a base de toda a visibilidade da Igreja. A catolicidade é a fé no espaço. A apostolicidade é a fé una no tempo e a santidade é o fruto da fé, que se concretiza nas almas com a graça do bom Deus, com a graça dos sacramentos. É completamente falso considerar-nos como se não fizéssemos parte da Igreja visível. […] Não somos nós, mas, sim, os modernistas que saíram da Igreja. Quanto a dizer “sair da Igreja visível”, É ENGANAR-SE EQUIPARANDO IGREJA OFICIAL E IGREJA VISÍVEL” (Trechos de sua conferência intitulada “La visibilité de L´Église et la situation actuelle”, proferida perante os ex-seminaristas de Ecône, em 09/09/1988, em Bolettin official du district de France de la Fraternité Sacerdotale Saint Pie X, nº 29, setembro de 1988). Enfim, até Dom Lefebvre reconhecia que a seita conciliar, que ele corretamente dizia que é uma igreja cismática, não é a Igreja Católica e tampouco manifesta ela, mas nós católicos não podemos concordar com Dom Lefebvre em dizer que a Fraternidade manifesta a Igreja Católica, pois, querendo ou não, a Fraternidade sempre permaneceu em comunhão com essa igreja cismática e sempre agiu de maneira cismática diante daqueles que ela considera como “autoridades legítimas”, ainda mais sob o governo de Dom Fellay, e sobre isto recomendo a leitura do artigo intitulado “Os Montes de Gelboé”, do Bispo Dom Donald J. Sanborn, que foi um Padre formado na Fraternidade.